Reclamações de quedas de energia se intensificaram após a chegada de calor extremo no estado. Especialistas na área explicam como o tempo quente afeta o fornecimento de energia.
Municípios de diversas regiões de Goiás têm sofrido com constantes quedas de energia elétrica. A situação se intensificou nas duas últimas semanas de setembro, quando uma onda de calor extremo atingiu parte do Brasil, incluindo o território goiano. Para entender as causas desse problema, o g1 ouviu especialistas na área, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e a Equatorial Goiás, responsável pela distribuição no estado – Veja explicações abaixo.
A cabeleireira Lindalva Oliveira mora no Setor Vila dos Alpes, em Goiânia, e afirma que tem ficado sem energia todos os dias desde que o calor começou. No domingo (24), em um prazo de quatro horas, ela conta que a energia caiu e voltou 15 vezes. Com isso, a geladeira não suportou e acabou queimando. “Não vai ficar barato”, lamentou.
A situação não foi diferente com a comerciante Letícia Gallo Perissato, dona de uma cafeteria em Goiânia. Na segunda-feira (25), ela precisou fechar as portas três horas mais cedo, porque os picos de energia não permitiam que ela concluísse os preparos. “Tenho uma fornada de 500 cookies para entregar e não sei como fazer”, afirmou.
Como o calor afeta a distribuição de energia?
- Sobrecarga na rede de distribuição
- Capacidade de geração de energia
- Superaquecimento de equipamentos
Especialistas ouvidos pelo g1 afirmam que uma onda de calor pode impactar o fornecimento de energia de várias maneiras. Uma delas é a partir do aumento do uso de aparelhos como ar-condicionado, ventiladores e climatizadores por parte da população.
“Isso gera uma sobrecarga na rede, que acaba desligando porque não estava preparada para isso. Não aguenta esse aumento repentino na demanda de energia”, explica o engenheiro eletricista Juan Colls.
Para se ter ideia, durante esse período de calor exagerado, a Equatorial constatou um aumento de 16% na demanda de carga elétrica em Goiás. O número está acima da média nacional, de 7%.
Fora isso, a capacidade de geração de energia também é afetada durante o calor. Isso porque, como grande parte da energia elétrica gerada no Brasil parte de hidrelétricas, o consumo exagerado por muito tempo pode afetar os níveis de água das usinas.
“As hidrelétricas podem ter seus níveis de represas diminuídos nos períodos prolongados de calor, afetando a capacidade de geração de energia para atender essa demanda gerada pelos aparelhos de ar-condicionado”, afirma o Leonardo Guedes, doutor em engenharia elétrica e professor da Universidade Federal Goiás (UFG).
Outro problema atinge os equipamentos da rede elétrica. Transformadores, por exemplo, podem sobreaquecer e perder eficiência, ou até mesmo falhar.
Interrupções rápidas
A distribuição de energia elétrica em Goiás passou a ser comandada pela Equatorial em janeiro de 2023. Antes disso, sob gestão da Enel, o estado também sofria com quedas de energia.
Em janeiro de 2021, por exemplo, uma granja a 40 quilômetros de Rio Verde, no sul do estado, perdeu cerca de 10 mil frangos por falta de energia elétrica. Na época, o produtor Ilceu José Rossa contou à reportagem que os animais ficaram cerca de 36 horas sem refrigeração dentro dos aviários e morreram devido ao calor intenso.
Ao assumir a concessão goiana, a Equatorial realizou um diagnóstico completo da rede elétrica, onde foi identificado que quase 50% das unidades transformadoras de distribuição de energia apresentam sobrecarga, 72% dos circuitos são monofásicos (com apenas um recurso de fornecimento) e 14% dos ativos da concessão depreciados.
Para evitar que os consumidores passassem muitas horas sem energia, a concessionária afirma ter investido na ‘conexão de religadores de rede’.
Segundo especialistas, na prática, os religadores não evitam a falta de energia, apenas diminuem o tempo que o consumidor vai ficar sem fornecimento. Isso porque, ele faz a reconexão de forma automática, sem a necessidade de deslocamento de uma equipe.
É por esse motivo que a cabeleireira Lindalva e a comerciante Letícia, citadas acima, afirmam que a energia acaba e volta várias vezes por dia em curtos períodos de tempo. São as chamadas ‘interrupções rápidas’.
Bom ou ruim?
Os especialistas ouvidos pelo g1 dizem que a estratégia adotada pela Equatorial possui pontos negativos e positivos.
“A estratégia é válida, pois diminui o tempo de falta de energia no consumidor. Se iria demorar 30 minutos para ocorrer o deslocamento da equipe e reparo da rede, este tempo pode ser diminuído para 1 minuto, por exemplo”, afirma Fernando Nunes Belchior, doutor na área de qualidade da energia elétrica e professor da UFG.
Dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) apontam que de janeiro a julho deste ano, o goiano ficou em média 1 e 37 minutos no escuro por mês. O limite estabelecido é de 12 horas por ano, ou seja, em média 1 hora por mês.
“O lado negativo são os custos elevados para a instalação e a necessidade de manutenção periódica dos religadores, que serão financiados pela conta de energia”, contrapõe Leonardo Guedes.
“Para áreas mais afastadas é difícil realizar a manutenção dos equipamentos, então regiões mais periféricas podem ter falhas de leitura e comando dos religadores”, reforça Juan Colls.
A Aneel informou ter recebido 1.051 reclamações contra a Equatorial Goiás de janeiro a agosto deste ano. Apesar de ainda ser um número alto, a autarquia destaca que esse é o menor índice dos últimos quatro anos, dentro do período analisado.
Queima equipamentos
Com o vai e vem de energia elétrica, a população reclama que os objetos eletrônicos e eletrodomésticos acabam sendo danificados.
Jonas Batista contou à reportagem que trabalha na Superintendência de Política de Atenção Integral à Saúde (Spais), no Setor Sul, em Goiânia. Na segunda-feira (25), lá caiu a energia 12 vezes e os computadores acabaram apresentando problemas.
O aposentado Valdeci Tuxim, também moradora da capital, afirma que a geladeira dela queimou com as interrupções frequentes. O prejuízo será de R$ 450.
O presidente da Equatorial Goiás, Lener Jayme, afirmou que os picos devem continuar acontecendo, mas garantiu que a melhora vai acontecer gradativamente.
“Não vendemos ilusões: os problemas continuarão ocorrendo, mas mostraremos que gradativamente vamos evoluir na qualidade da rede”, admitiu.
O engenheiro eletricista e conselheiro do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Goiás (Crea-GO), Alexandre Gomes de Souza, argumenta que o consumidor deve cobrar manutenções e melhorias.
“Se está acontecendo uma sobrecarga no circuito a gente tem que cobrar da Equatorial para que sejam feitos os investimentos necessários. Se é por falta de manutenção também. Tem como cobrar uma manutenção de maior qualidade para prevenir isso. O que dá a entender, é que o sistema precisa de melhorias, tanto da parte da manutenção quanto da estrutura, para suportar esse aumento de carga”, defende.
Ressarcimento
Sobre os danos, a Equatorial informou ao g1 que o consumidor pode entrar em contato pelos canais de atendimento para serem ressarcidos do prejuízo (veja abaixo).
A Equatorial pode optar pela verificação no local do equipamento danificado, devendo informar ao cliente a data e o horário da visita. O prazo máximo para realização desta checagem é de 10 dias, contados a partir da data da solicitação do ressarcimento.
Após a vistoria ou liberação da vistoria, o cliente deve apresentar:
- 01 laudo e orçamento de empresa autorizada para conserto; ou
- 02 laudos e orçamentos, no caso de ser uma empresa especializada, referente ao conserto do(s) aparelho(s) danificado(s).
A distribuidora deve informar ao consumidor o resultado da solicitação de ressarcimento, em até 15 dias contados a partir da data da apresentação dos laudos e orçamentos.
Canais de atendimento:
- Agência virtual, no site equatorialenergia.com.br;
- Call Center 0800 062 01 96 ou;
- Agências de atendimento.
Fonte: G1/Goiás